Cientistas criam geoengenharia na atmosfera
O aquecimento global pode parecer um processo imparável, irreversível, que só pode ser retardado através de um esforço global concertado para reduzir as emissões de carbono e parar de poluir a atmosfera, mas e se houvesse uma maneira que pudéssemos ativamente colocar o aquecimento global em pleno reverso?
Durante anos, os cientistas têm pensado em várias soluções de geoengenharia para a mudança climática, cada uma delas destinada a reverter o dano que estamos fazendo ao planeta usando tecnologias modernas.
Agora, como parte de um novo estudo inovador, pesquisadores da Universidade de Harvard estão planejando lançar aerossóis especiais para a estratosfera em um esforço para bloquear a radiação solar entrante.
O experimento verá um balão subir 20 km acima do solo, onde irá criar uma pluma de cristais de gelo flutuantes cobrindo uma área de aproximadamente 1 km de comprimento e 100 m de largura.
Os cientistas então tomarão medidas como o balão passa através da nuvem.
“A idéia de que você poderia até pensar em ajustar a temperatura do planeta é aterrorizante”, disse Frank Keutsch, um dos cientistas envolvidos no estudo.
“Mas as conseqüências das mudanças climáticas também são bastante aterrorizantes, este é um assunto muito sério”.
Tecnologias propostas
Gerenciamento da Radiação Solar (SRM): Reflexo de raios solares para que não cheguem à superfície da Terra e retornem ao espaço.
Melhoramento do albedo: Aumento da refletividade das nuvens sobre a superfície da Terra, para que mais do calor do Sol seja refletido de volta para o espaço.
Refletores espaciais: Bloquear uma pequena proporção da luz do sol antes que ela chegue à Terra.
Aerossóis estratosféricos: Introduzir pequenas partículas refletivas na alta atmosfera para refletir parte da luz solar antes que ela alcance a superfície da Terra.
Remoção de Dióxido de Carbono (CDR): Remoção de CO2 da atmosfera.
Reflorestamento: Esforços de plantação de árvores em escala global.
Biocarbono: Queimar biomassa (plantas) e enterrá-las para que o carbono fique preso no solo.
Bioenergia com captura e sequestro de carbono: Cultivo de biomassa, queima para a produção de energia e captura do CO2 gerado no processo, que é armazenado.
Captura no ar ambiente: Construção de máquinas que podem remover o CO2 diretamente do ar ambiente e armazená-lo em outro lugar.
Fertilização oceânica: Acrescentar nutrientes ao oceano em lugares selecionados para aumentar a produção de fitoplânctons, que absorvem CO2 da atmosfera.
Meteorização melhorada: Expor grandes quantidades de minerais que reagem com o CO2 na atmosfera e armazenar os compostos resultantes nos oceanos ou no solo.
Aumento da alcalinidade do oceano: Moer, dispersar e dissolver tipos de rochas como calcário, silicato ou hidróxido de cálcio no oceano para aumentar sua habilidade para armazenar carbono e combater a acidificação oceânica, um dos efeitos das mudanças climáticas.
Riscos
Alguns cientistas observam que manipular o clima em uma parte do mundo poderia ter consequências em outros lugares. Por isso, dizem eles, qualquer ação desse tipo deveria ser feita em escala global com um acordo internacional.
A alteração do clima de outro país é até mesmo classificado como um crime de guerra de acordo com a Convenção de Genebra de 1976.
O professor Paul Nightingale, do departamento de pesquisas em políticas de ciência e tecnologia da Universidade de Sussex, na Grã-Bretanha, diz que não há atualmente uma infraestrutura montada para que tais decisões sejam tomadas sobre o clima global.
Rose Cairns, também da Universidade de Sussex, escreveu um relatório para o Economic and Social Research Council (ESRC) sobre o tema. Ela diz que uma questão é que a geoengenharia permanece um termo extremamente ambíguo, porque a tecnologia é muito ampla.
Aspergir aerossóis na estratosfera, por exemplo, poderia ser “altamente polêmico”, enquanto um projeto global para plantar árvores causaria muito menos furor.
Zona de perigo?
Como acontece com qualquer nova tecnologia, os efeitos colaterais imprevisíveis da geoengenharia não devem ser descartados.
Por exemplo, além de qualquer benefício que poderia haver, acredita-se que espalhar aerossóis de enxofre poderiam esgotar o ozônio atmosférico e exacerbar o risco de secas, particularmente na Ásia e na África, onde poderia afetar as monções.
Outra vez, o problema recai sobre os tomadores de decisões. “Quem vai decidir o que constitui uma emergência tão séria para permitir a mudança da temperatura do planeta?”, questiona Cairns.
“Quem tomaria esse tipo de decisão, levando em consideração que algumas dessas tecnologias arriscam, por exemplo, afetar as monções e os padrões de chuva?”, diz.
Outra questão é que uma vez que a geoengenharia se torne uma opção, pode tirar a sensação de urgência de se reduzir as emissões de CO2.
“Nesse sentido, conceitualmente, é bem perigoso até mesmo ter essa opção sobre a mesa”, afirma Cairns.
Custos
Outro fator importante é o custo considerável de usar novas tecnologias em uma escala global.
Apesar de os custos financeiros poderem ser menores que o custo da falta de ação, Nightingale diz que seria melhor gastar o dinheiro em tornar a produção de energia mais limpa.
“A termodinâmica de tirar o CO2 do ar é muito mais cara do que tirar o CO2 dos escapamentos e das usinas”, explica.
“Parece uma série de tecnologias muito cara, complicada e arriscada para se considerar quando já temos várias tecnologias que são ambientalmente benignas”, diz.
Prazos
Por ora, somente testes de geoengenharia de pequena escala podem ser feitos, desde que não afetem a biodiversidade, numa regra determinada pela Convenção da ONU sobre Biodiversidade, de 2010.
A limitação foi em parte consequência do forte lobby do grupo ambientalista internacional ETC. Eles dizem que a sua maior preocupação era “o controle internacional dos sistemas planetários: nossa água, nossa terra e nosso ar”.
Eles também expressaram preocupação de que Estados mais ricos poderiam ver isso como “um conserto rápido e barato para as mudanças climáticas”, deixando o combate das atuais questões climáticas sem recursos.
Andy Ridgwell, professor da Universidade de Bristol, na Grã-Bretanha, observa porém que já estamos afetando a biodiversidade “jogando carbono na atmosfera”.
Mas ele diz que é mais provável que “nós sigamos nos adaptando” do que tenhamos projetos de geoengenharia de larga escala no futuro próximo.
“A não ser que as camadas de gelo derretam, não vejo um ponto no qual tenhamos ultrapassado um limite fundamental no qual os maiores emissores do mundo concordem de repente que precisamos fazer algo”, diz Ridgwell.
“Considerando que a geoengenharia precisaria de um acordo internacional, suspeito que as temperaturas continuarão subindo e que as pessoas terão de se adaptar”, observa.
Shepherd concorda que estamos longe de fazer qualquer coisa “além de discutir e pesquisar”. Mas ele acrescenta que a geoengenharia seria a única forma de realmente reverter as mudanças climáticas.
“O controle das emissões nunca reverterão isso. Estamos fazendo o que é essencialmente uma mudança irreversível no clima em escala de tempo humano. O planeta ainda está desbalanceado e os oceanos ainda estão se aquecendo”, diz.
Comentários